No limiar do deserto
Os monges foram, desde os primeiros tempos da Igreja, homens e mulheres que, para viverem a vocação cristã de uma forma radical, sentiram necessidade de se afastarem, de viverem no limiar da sociedade e também da Igreja. Um Mosteiro está, em geral, junto dos desertos, das montanhas, dos bosques...
À sua frente permanece a cidade; um pouco distante mas não muito. Atrás de si o lugar desabitado, o silêncio e a solidão. O monge contempla a cidade e a Igreja: delas não se separa nunca, com elas mantém contacto, por elas intercede e reza em absoluta solidariedade. A elas, por vezes, se dirige com uma palavra, com um gesto, com silêncio. Outras vezes, para proteger o que lhe foi confiado, volta-se para o deserto dando a impressão de lhes ter voltado as costas. Não há qualquer tipo de desprezo nesta atitude mas apenas a sede de se voltar para o Senhor, no silêncio e na escuta.
Bose gosta de se definir como um comunidade no limiar do deserto (junto ao deserto): uma comunidade que, ao silêncio, à escuta da Palavra e à sua vida fraterna, procura associar o acolhimento ao ser humano, para caminhar junto com a humanidade e dar voz às suas alegrias e esperanças, tristezas e angústias.
Assim, a vida de um Irmão e Irmã de Bose, é ritmada, por um lado, pelo louvor a Deus através da oração e, por outro, pelo serviço imprescindível aos Homens através do seu trabalho profissional e através do acolhimento aos hóspedes, aos viajantes e peregrinos, para além do serviço à Igreja e às Igrejas. Se, como diz a Regra de S. Bento, a primeira coisa que se deve perguntar ou dizer, a quem queira entrar para um Mosteiro, é "se procuras, de facto, Deus...", em Bose é convicção geral que, apenas no rasto de Cristo, isto é, no servir e no dar a vida por cada Homem, é possível procurar/ encontrar Deus e não um ídolo.
Então, porquê no limiar do deserto? Para se especializar na escuta e no conhecimento do Senhor e ao mesmo tempo se especializar em Humanidade. O fim é o amor, a caridade.
Irmão, Irmã, tu não estás mais só! Tu deves contar, em tudo, com os teus irmãos.
Ama-os, porque Deus tos deu como guardas, da mesma forma que Cristo te amou até ao fim.
Ama esta comunidade e com ela e através dela todos os homens. Ama todas as criaturas, por elas louva Deus e através delas procura a purificação, ensino e consolação.
Tu foste chamado a ser um sinal de amor fraterno!
(Regra de Bose 2).
A caridade é o télos, o objectivo da vida cristã. Por isso a forma de vida escolhida em Bose, desde o princípio, foi a do cenóbio, para que tudo seja orientado para a vida e para a comunhão fraterna. Dando sempre primazia à palavra de Deus, procura-se pôr tudo em comum para que a vida da comunidade seja marcada por uma partilha de tal forma radical que possa ser sinal da comunhão trinitária que se dilata a toda a criação.